Diário de um intercambista malacabado: Goodbye, San Francisco. Olá, Aracaju.

em 29 de outubro de 2017


Bom, já estou de volta há duas semanas depois de passar 33 dias nos EUA. Quando viajei e comecei esta série de textos a intenção realmente era fazer um diário, produzir um novo texto a cada dois ou três dias contando as novidades da minha viagem. A aventura de um malacabado tentando se virar por conta própria em um país estrangeiro.
Realmente não consegui cumprir nem de perto esse cronograma, não levei computador porque a intenção era aproveitar os preços mais em conta para comprar um novo nos EUA, e escrever textos longos no celular é complicado. Na escola eu tinha acesso aos computadores do laboratório de informática, mas geralmente ao fim das aulas eu só queria sair pra almoçar. No hostel onde estava hospedado havia um computador no lobby à disposição, mas eu não queria ficar escrevendo por lá com o vai e vem de um monte de gente, então ficou pra depois. Aqui vai um pequeno resumo da aventura de um intercambista malacabado.
Pra começar: não foi fácil! Mas já falei aqui outras vezes: "Quem quer, dá um jeito. Quem não quer, dá desculpa". Como a certeza da viagem só aconteceu na última hora, durante a última semana, não pude planejar tudo como gostaria. Com mais tempo hábil eu teria planejado os melhores trajetos, as rotas de ônibus e metrô, os passeios que gostaria de fazer, onde e o que gostaria de comprar e mais uma infinidade de coisas. Mas quando não dá pra planejar, seguimos a lei do improviso.
Nos primeiros dias fiz o trajeto até a escola de ônibus, pegava o primeiro a 50 metros do hostel e um segundo que me deixava a pouco mais de uma quadra do destino. San Francisco é uma cidade de altos e baixos e a minha preocupação era que tivesse uma subida no meio do caminho. Depois percebi que a maior parte era uma descida suave e o restante era predominantemente plano. Então passei a ir rodando pra aula e pegava apenas um ônibus na volta, que subia a rua e eu só precisava descer um quarteirão pra chegar em casa.
As calçadas da cidade seguiam um padrão, havia rampas em todas as esquinas (a grande maioria bem feita) e as adaptações dos ônibus funcionavam perfeitamente. Os motoristas eram em grande maioria bastante solícitos e bem preparados, então não tive problemas. O sistema de trens e metrô também funcionava muito bem, apesar de ser bem sujo. Não tinha graves problemas de acessibilidade, mas geralmente havia apenas um elevador por estação, que estava sempre fedendo a mijo de mendigo. San Francisco tem muitos moradores de rua e acho que eles aproveitavam o ambiente reservado dos elevadores pra dar aquela aliviada. Felizmente não me deparei com nenhuma cagada. 💩💩💩
Rodar grandes distâncias sozinho pela cidade seria bem complicado, mas quem tem amigos tem tudo. Foi fácil me cercar de gente boa, amigos que estavam sempre dispostos a ajudar. Tinha brasileiros, japoneses, turcos, taiwaneses, italianos... Ao todo eram alunos de vinte e três nacionalidades na escola, todo mundo sempre ali pra dar uma forcinha quando eu precisasse. Claro que a ousadia de um cara na cadeira de rodas se virando sozinho por lá causava um certo estranhamento, mas ao conviver um pouco mais todos passavam a encarar a situação com naturalidade. Volta e meia eu ouvia aquele papo chato sobre ser um exemplo de superação e todo aquele blá blá blá que já conheço de cor e salteado. Mas a maneira que eu vejo as coisas é bem simples: eu tenho os meus problemas e as minhas dificuldades pra enfrentar a vida, mas dificuldades todo mundo enfrenta, uns mais, outros menos. A vida nem sempre é justa, mas é assim que ela é. A cadeira de rodas me impõe um série de limitações, mas o fato é que ela chama muita atenção, e talvez por isso desperte esse sentimento de admiração.
O meu curso de Business English (inglês para negócios) tinha aulas apenas pela manhã, então eu tinha as tardes livres pra fazer o que quisesse. E geralmente era um passeio com "ozamigos". Deu pra rodar bastante por San Francisco, conhecer os pontos turísticos, comer bastante junk food, visitar as cidades vizinhas... Não quero me alongar muito contando os detalhes de cada passeio, a intenção desse post não é ser um guia turístico para os malacabados que resolverem se aventurar por San Francisco, mas dividir um pouco da experiência enriquecedora que tive por lá. Como não sou um grande fã de fotos, não vou postar milhares de imagens aqui, mas quem tiver curiosidade pode dar uma olhada em alguns lugares que visitei no Instagram.
Por mais que um período de quatro semanas não seja longo o suficiente para uma imersão completa em um cultura diferente, dá pra aprender muita coisa se você souber utilizar o tempo que tem e mantiver a mente aberta. Viver a rotina de SF foi muito interessante, a escola ficava no coração do Financial District, bem no centro da cidade, onde as coisas acontecem. Era muito legal ir para a aula pela manhã vendo as pessoas indo trabalhar usando transportes bem alternativos. Gente vestida de maneira formal indo trabalhar de bicicleta, skate, patinete... Claro que havia bastante trânsito, muitos carros nas ruas, ônibus, bondes, mas muita gente preferia outras alternativas.
O convívio com alunos de tantas nacionalidades diferentes também foi muito legal. Ouvir tantos sotaques de várias partes do mundo me ajudou a melhorar bastante o meu entendimento da língua. Tanto que, às vezes, eu já me pegava pensando em inglês. Nas conversas com os outros alunos era sempre interessante trocar experiências sobre os costumes de cada país e aprender como cada cultura encarava assuntos diferentes. Um dos passatempos favoritos era ensinar alguns palavrões em português e depois ficar se divertindo com eles falando sem parar. Os japoneses, muito educados, achavam o máximo e sempre queriam aprender um novo. O preferido era, sem dúvida: "Puta que pariu!".
Foram quatro semanas vividas intensamente em San Francisco, na última eu já me sentia meio dividido, era um misto de emoções. De um lado aquela saudade que já vinha há algum tempo dando sinais de vida, do outro um pouco de tristeza, uma nostalgia antecipada por deixar pra trás uma experiência tão valiosa. Acho inclusive que as dificuldades inerentes à minha condição me fizeram valorizar ainda mais a oportunidade. O investimento financeiro é alto, claro. O investimento emocional, as expectativas criadas, também. Mas a experiência valeu todo o esforço para que desse certo. Antes de voltar pro Brasil ainda deu pra relaxar alguns dias em Miami na casa de um grande amigo, José Maurício, que fez questão de receber a mim e Alice na sua casa. Sim, a digníssima foi me encontrar em Miami e passamos uns dias passeando por lá.
O saldo final foi muito positivo. Volto dessa viagem com um entendimento mais amplo de mim e do mundo. Com mais segurança a respeito das minhas capacidades. Com mais amigos do que tinha quando fui e com a bagagem cheia de experiências enriquecedoras. Sim, o meu inglês está melhor, agora conheço algumas expressões que não conhecia, entendo um pouco melhor a linguagem técnica do mundo dos negócios. A princípio esse era o objetivo e estou feliz em tê-lo alcançado, mas o aprendizado foi bem maior que tudo isso. E essa certeza eu trouxe na mala.
Bola pra frente e até a próxima.

Diário de um intercambista malacabado: Lavando a roupa suja.

em 26 de setembro de 2017

"Lava roupa todo dia, que agonia
Na quebrada da soleira, que chovia..." 🎶🎶🎶

A música é "Juventude Transviada", de Luiz Melodia, e nada tem a ver com o tema deste post além dos dois primeiros versos. Mas, como já disse outras vezes, o blog é meu e eu faço o que eu quero.
Pois bem, nessa jornada de intercambista malacabado aqui na Califórnia tenho feito muita coisa além de estudar: passeio bastante, visito vários lugares, compro uma coisinha aqui outra ali... Os desafios são constantes. As ruas de São Francisco são bem preparadas: rampas em todas as esquinas, calçadas quase sempre padronizadas, transportes coletivos acessíveis (com direito a cheiro de mijo nos elevadores e plataformas do sistema de trens e metrô)... A geografia da cidade é que não ajuda muito, já que SF é cheia de altos e baixos e as ladeiras são inimigas mortais dos cadeirudos. Mas isso é assunto pra outra história.
Vamos em frente: apesar da minha disposição pra encarar as adversidades, tem uma coisa que eu não tinha me atrevido a fazer desde o meu acidente: lavar roupa suja (literalmente). Não que eu fosse um exímio lavador de roupas, na verdade, mesmo quando morava sozinho, tinha quem o fizesse por mim. Durante a maior parte do tempo que passei em São Paulo, a vida colocou no meu caminho uma senhora baixinha do interior de Pernambuco que atendia pelo apelido de Bibiu. Ela era esposa do zelador do prédio e prestava serviço como diarista para alguns dos condôminos, incluindo aquele moleque de mais ou menos vinte anos que morava no apto. 12. Me tratava praticamente como um filho, mas infelizmente nos deixou de forma precoce há algum tempo. Enfim, mesmo tendo a Bibiu cuidando de quase tudo pra mim, às vezes eu precisava fazer algumas coisas por conta própria, e isso podia incluir lavar algumas roupas.
Bom, anos e anos depois, o aleijadinho resolve procurar sarna pra se coçar e se mete numa de fazer intercâmbio sozinho. Hospedado num hostel que não tem serviço de lavanderia, apenas uma lavanderia comunitária, ele se vê na situação em que precisa lavar as suas próprias roupas. E agora, o que ele faz? Hora de usar os conhecimentos aprendidos nos primórdios do século 21...




Vai no Walgreens (uma espécie de farmácia em que se encontra absolutamente de tudo - coisa de americano), compra o que precisa, volta para o hostel, planeja passo a passo tudo o que precisa fazer (como todo malacabado esperto) e encosta o umbigo no tanque. Ou melhor, estaciona a cadeira do lado das máquinas.
Separa as roupas, abre as roupas, coloca as roupas na máquina, coloca a quantidade correta de sabão, fecha a máquina, seleciona o programa e manda brasa. Meia hora depois, abre a máquina, tira as roupas, abre as roupas, coloca na secadora, limpa o filtro da secadora, fecha a secadora, seleciona o programa e manda brasa. Quarenta e cinco minutos depois, volta, retira as roupas da secadora, confere se estão lavadas e secas... Sucesso!



Missão quase cumprida. Hora de voltar pro quarto, mas deu preguiça de guardar tudo agora. Ah, deixa pra lá! A roupa já está toda limpa e seca, depois eu dou um jeito nisso...
Beijo nas crianças! Em breve, cenas dos próximos capítulos.

Diário de um intercambista malacabado: O desafio do planejamento.

em 14 de setembro de 2017

É fato consumado! Pra tudo que vamos fazer na vida deve haver algum planejamento, pelo menos se você pretende fazer bem feito. Para malacabados, aleijadinhos e afins não é diferente. Nesse caso é ainda mais importante, é aí que a brincadeira fica séria.
Como já havia falado no post anterior, a grande dificuldade pra mim foi encontrar um lugar que pudesse me acomodar. E veja bem, a tarefa a princípio nem era das mais complicadas, porque a minha situação não exige necessariamente que o lugar seja adaptado, se ele for acessível eu já consigo me virar. E quando falo em acessível, basta ter uma porta que eu consiga entrar e um espaço razoável por conta da cadeira de rodas.
Depois de várias tentativas, mudanças de programação, busca de alternativas... encontramos aqui em San Francisco um hostel que poderia me hospedar. O quarto não é muito espaçoso, mas é o suficiente. Segue aquela linha que falei antes: não é adaptado, mas é acessível. Já o banheiro, grande terror dos cadeirantes, é bastante amplo e adaptado. Não têm uma cadeira de banho disponível, mas me arranjaram uma cadeira de plástico e, problema resolvido. Poucas coisas a melhorar.
Caso algum aleijadinho ousado como eu tenha a intenção de encarar um intercâmbio sozinho fica aqui a minha dica. O hostel que me hospedou é o Vantaggio, que fica na 505 O'Farrel Street, San Francisco. Já conversei com o pessoal aqui e eles têm dois quartos nessas condições. Não cheguei a ver o outro, mas deve seguir o mesmo padrão.
O café da manhã está incluso e os apartamentos são no estilo Studio: no quarto tem uma cama, um pequeno móvel para as roupas, uma pia, frigobar e microondas.
O único serviço é a limpeza dos quartos, que é feita uma vez na semana. A lavanderia fica à disposição dos hóspedes, que lavam sua própria roupa. Ainda não precisei utilizá-la, só estou hospedado há quatro dias, mas quando for necessário, naturalmente darei um jeito.
Pra melhorar a minha circulação no quarto pedi pra tirarem a mesinha de estudos, ela me impedia de chegar até o móvel pra guardar as roupas. Depois disso a situação ficou mais agradável.
Sem mais delongas, deixo aqui algumas fotos, os curiosos já vinham me cobrando.






Como havia dito, a mesa atrapalhava a circulação e pedi que fosse retirada.

Diário de um intercambista malacabado: De repente Califórnia.

em 11 de setembro de 2017

"Garota eu vou pra Califórnia
Viver a vida sobre as ondas
Vou ser artista de cinema
O meu destino é ser star..." 

Alice já não aguentava mais me ouvir cantarolando essa música desde a última quarta-feira, quando, mesmo depois de muito planejamento, parecia que os meus planos de fazer um curso no exterior seriam desfeitos mais uma vez.
Sim, mais uma vez. Porque quando eu me acidentei, um dos planos que eu tinha para o momento era uma extensão universitária no exterior que, assim como muita coisa na minha vida, não se concretizou pelo mesmo motivo.
Pois bem, pouco mais de onze anos depois resolvi tentar mais uma vez. Eu já me sentia seguro o suficiente, independente o suficiente. Então comecei a planejar. Não que eu achasse que seria fácil, afinal essa palavra poderia ter sido riscada do dicionário da minha vida depois do dia 21 de julho de 2006.
O projeto inicialmente era o Canadá, por sugestão de Thayana, consultora online do STB (Student Travel Bureau), que argumentou que o custo seria menor por conta da diferença na taxa cambial (o dólar canadense é consideravelmente mais barato que o americano). Somado a isso, ela tinha acabado de planejar um curso pra uma moça que também é cadeirante e eu poderia ir pra mesma escola em Toronto.
Ela me disse que a escola e a equipe são muito solícitas e me conseguiriam uma acomodação acessível na cidade.
Mas sabe como é, né? Vida de aleijado não é fácil. No meio do caminho a Polícia Federal surge com a notícia da suspensão da emissão dos passaportes por falta de verba, isso porque cada cidadão que precisa tirar o documento paga uma taxa de quase 300 reais. Coisas do Brasil... Agora eu só podia esperar. Já tinha pagado o valor referente à matrícula e assinado o contrato, mas a efetivação estava condicionada ao passaporte e à acomodação.
Assim que o passaporte fosse emitido eles começariam a procurar um homestay pra me hospedar. Homestay é a modalidade de hospedagem em que famílias recebem estudantes de outros países em suas casas.
Após semanas de incerteza o passaporte finalmente saiu e a escola iniciou a procura.
Semana após semana eu buscava notícias, mas eles nunca conseguiam. Entramos no deadline da escola e na última semana antes do início do curso. Lá de Toronto a esperada boa notícia nunca chegava, então comecei a buscar outras soluções.
Entrei em contato com Mariana, uma amiga querida que mora em Vancouver, e pedi ajuda. Começamos a considerar outras possibilidades. Eu já andava desesperançoso e com raiva, depois de tanto planejamento a bendita lesão medular ia me fuder de novo. Férias programadas no trabalho, curso escolhido, planejamento feito, mas talvez isso não fosse o suficiente. Depois de tanta expectativa parecia que não ia dar certo.
Caroline, a gerente de Thayana no STB, já acompanhava o meu caso de perto e buscava alternativas. Eu achava que talvez não desse mais.
Mas eis que "De repente... Califórnia". Uma escola em San Francisco tinha um curso com uma carga horária que eu poderia fazer com o meu visto de turismo americano e, pasmem, uma residência estudantil próxima tinha condições de me receber. O curso ficaria um pouco mais caro, as passagens ainda precisavam ser compradas, detalhes que já tinham sido deixados de lado agora precisavam ser resolvidos. Foram três dias muito estressantes.
Mas nessa (tragi)comédia da vida aleijada não tem nada fácil. E agora eu tô aqui, na cama do quarto em San Francisco, escrevendo esse post gigante no meu celular e pensando: Chupa lesão medular!



Disreflexia Autonômica - Parte II

em 4 de junho de 2017

Como já expliquei muita coisa a respeito da disreflexia em um post anterior, não vou me repetir. Mas quem ainda não sabe do que estou falando é só dar uma olhada aqui.
Bom, depois se sofrer por algum tempo com os inconvenientes causados pela disreflexia resolvi ir ao médico (já faz mais de dois meses, mas só agora decidi falar a respeito). Pois bem, fui visitar o meu competentíssimo neurologista e expliquei pra ele o que vinha acontecendo. Tivemos uma longa conversa sobre o meu caso e também outras amenidades.  Ele ouviu atentamente as minhas queixas, expliquei que já tinha identificado o gatilho que disparava os sintomas da disreflexia: o calor. Meu corpo não estava conseguindo regular bem a temperatura, minha transpiração, que é afetada pela lesão medular, não estava funcionando. Aí o motor véio acabava superaquecendo.
Ele me explicou que a disreflexia, assim como outras formas de disautonomia, eram comuns em pacientes neurológicos. Contou-me a respeito de outros casos que passaram por ele e me deixou bem tranquilo. Me explicou que em alguns casos é possível usar medicamentos que ajudam a inibir ou pelo menos reduzir as reações e me solicitou alguns exames.
A disreflexia realmente estava me incomodando muito, a ponto de atrapalhar o meu convívio social. Eu já estava evitando alguns lugares e situações que pudessem me expor ao calor e, se continuasse daquele jeito, ia acabar virando um recluso.
Pois bem, realizei os exames e o único problema detectado, como ele suspeitava, foi uma deficiência de Vitamina D. Não, isso não tem nenhuma relação direta com a disreflexia, mas pode ocorrer na minha condição e ele queria se certificar. Ao analisar os exames, ele me passou apenas a reposição oral da vitamina por alguns meses. Me explicou que, ao pesquisar o meu caso, descobriu que lesões como a minha não respondem bem ao medicamento. Solução? Não tinha solução, eu só poderia adotar um comportamento de fuga ou esquiva. Continuar fazendo o mesmo...

😨😨😨😨😨😨😨😨😨😨😨😨
Fudeu! Pensei...

Mas tudo bem, vamos em frente. Com a cabeça no lugar comecei a procurar uma solução para o meu caso. Eu tinha sofrido bastante com a disreflexia nos três primeiros anos pós-acidente e, analisando meu histórico, percebi que depois que comecei a praticar atividades físicas, meu corpo foi aos poucos conseguindo regular a transpiração e as crises foram diminuindo até desaparecer por completo. Dividi esse pensamento com o doutor e ele também achou que aquilo fazia todo o sentido. O basquete em cadeira de rodas e o paraciclismo, que eu pratiquei durante algum tempo, tinham me ajudado com o problema. Como agora eu já estava parado há algum tempo, os benefícios conseguidos se foram. Aí imaginei que uma nova atividade aeróbica poderia me ajudar novamente.
Mas eu não queria ficar brigando com o calor, senão toda vez que meu corpo aquecesse eu teria que parar a atividade e resfriá-lo, para que aos poucos a tolerância ao calor aumentasse, a transpiração se autorregulasse, até que eu me visse livre de novo. Pensei em começar a nadar e parece que está funcionando. As crises já vinham ficando menos constantes, mas, coincidência ou não, acredito que a natação tem ajudado. Ultimamente as coisas estão bem mais tranquilas.
Essa vida de lesado medular não é fácil. Mas, aleijadinhos e aleijadinhas do meu Brasil, se a gente não der um jeitinho nos problemas nunca veremos solução. Bom, essas foram as últimas novidades, aguardem cenas dos próximos capítulos.

A revolta de Pedrinho.

em 24 de abril de 2017

Vamos falar de acessibilidade, mas sem chover no molhado.  Durante a semana minha amiga Luciana me marcou nos comentários em um vídeo no perfil do querido Pedrinho. E quem é esse tal de Pedrinho? Pedrinho é o cara, como o próprio perfil no Facebook o apresenta.
O cara é um moleque pra lá de espirituoso, filho de um casal de amigos de quem sou admirador confesso. Mas por que tanta admiração? Bom, porque eles criam o nosso protagonista levando em conta as suas potencialidades e não suas limitações. Pedrinho é criado como uma criança normal, porque é isso que ele é. Sim, ele faz fisioterapia. Sim, ele tem algumas limitações que outras crianças não têm. Sim, ele precisa de uma ajudinha a mais aqui e ali (e quem não precisa?). Mas espere um pouco... Sim, ele também canta. Sim, ele toca. Sim, ele é fã do Rei Roberto Carlos. E ele tem um sorrisão de criança, mas uma lucidez de gente grande.
Lembram daquele vídeo que eu falei no início do post? Pois bem, o cara gravou um vídeo externando sua indignação com a falta de acessibilidade no entorno do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. E esse vídeo fez um barulho...


Em pouco tempo o Einstein se manifestou nas redes sociais reconhecendo a falha e ressaltando a sua preocupação com o assunto. Segue a resposta do hospital:



O mais legal dessa história é tentar enxergar pelos olhos dele o absurdo da situação. A sinceridade, a sensibilidade e a indignação de uma criança que conhece seus direitos e sabe que o respeito às diferenças não é um favor a ser feito pelos outros, mas uma obrigação. O Einstein também está de parabéns pela retratação e pelo reconhecimento do erro. Agora o vídeo de Pedrinho depois da resposta:


Sigam esse carinha aí no Facebook (link aqui) e me digam o que acharam nos comentários aqui embaixo...
É isso aí, beijo nas crianças!

Varanda Resto Bar - Avaliação de acessibilidade

em 8 de abril de 2017

O Varanda é um novo bar aberto há pouco tempo onde antes havia outro bar tradicional aqui de Aracaju, o Chopp 13, que fechou as portas depois de muitos anos. O lugar é privilegiado, de frente pra Avenida Beira Mar (que apesar do nome, beira o Rio Sergipe) e pro Calçadão da 13 de Julho; e faz jus ao nome "Varanda", como dá pra ver na foto da fachada.

A varanda do "Varanda".
Fonte: https://www.facebook.com/varandarestobar

Pelo que me lembro, a estrutura não foi alterada, mas com a reforma e a nova decoração o local ficou muito mais bonito e agradável. Um toldo de abertura e recolhimento elétricos protege da chuva em caso de necessidade. Ontem mesmo pude presenciar o funcionamento, já que começamos aquela fase de chuvas aqui no litoral do nordeste. Durante o acionamento o toldo fez um barulho alto, talvez porque faltava lubrificação. Mas acredito que o pessoal vai dar conta disso, fica a dica. 😉
Os tiragostos que pedimos estavam todos muito saborosos e os chopps 🍺🍺🍺 estavam bem gelados. Pra quem quiser uma opção diferente, no andar superior funciona uma filial do Villa do Sushi, com opções de rodízio e à la carte. Nada de elevador, mas o sushi pode ser servido no andar de baixo também, sem problemas, já que os dois estabelecimentos funcionam juntos. 😋😋😋🍣🍣🍣
Agora vamos ao que interessa: Acessibilidade. A entrada do Varanda é por uma rampa, não tem escada, nenhum degrau. Pra ficar melhor, a inclinação podia ser um pouco mais suave, mas a rampa já era assim desde a época do Chopp 13. Quem tem um bom controle da cadeira não terá grandes dificuldades pra subir ou descer, mas alguém com limitações maiores vai precisar de ajuda. Umas faixas antiderrapantes coladas no chão podem deixar a rampa um pouco mais segura, o chão molhado pode ser traiçoeiro.

Rampa fotografada de dentro pra fora do Varanda.
Bem executada, corrimão do lado direito.

Pelo que vi, o Varanda tem três tipos de mesas. Dois modelos redondos com pés centralizados que permitem um bom encaixe da cadeira de rodas sob o vão. A mesa maior é perfeita, na altura e na facilidade de encaixe, a mesa menor permite um bom encaixe da cadeira, mas o tampo pequeno não permite ao cadeirante se aproximar tanto, o que significa sujeira caindo no colo. 😅😅😅 O outro modelo é uma mesa quadrada com pés que, aparentemente, não permitem a boa acomodação da cadeira (não cheguei a fazer o teste, mas é o que diz minha experiência). Os pés do cadeirante encostam no pé da mesa e não permitem ao cadeirante se "encaixar" confortavelmente. Mas essas questões de mesa são recorrentes e quem é cadeirante já está acostumado a dar um jeitinho. Nem tudo pode ser perfeito... Com exceção do banheiro.

Como deve ser.

 Mesa redonda com o tampo grande e um bom vão livre pra acomodar a cadeira.

Mesa redonda com o tampo pequeno.

O banheiro é sempre o ponto mais crítico para a acessibilidade em qualquer lugar, mas não aqui no Varanda. O ideal é que haja um banheiro separado para as pessoas com deficiência, já que há casos em que estas fazem uso de sondas, especialmente no caso de lesados medulares que fazem o cateterismo intermitente, como este que vos fala. Nós estamos bem mais sujeitos a infecções urinárias, e os banheiros comuns, utilizados por muita gente, tendem a ter muita sujeira e viram um foco de contaminação. No Varanda o banheiro é exclusivo, como deve ser. Amplo, limpo e bem adaptado. Não encontrei nenhum defeito.

 Porta de entrada do banheiro exclusivo, bem identificada.

Interior do banheiro exclusivo.

Geralmente eu não me incomodo em encarar as dificuldades dessa "comédia da vida aleijada". Mas existem aqueles momentos em que me sinto cansado frente às dificuldades. Algumas vezes deixo de sair simplesmente pra não esbarrar nas barreiras arquitetônicas, outras vezes as pessoas que vão comigo mudam os planos pela falta de acesso nos locais e acabamos indo a lugares que possam me receber adequadamente. Ou seja, quem descuida da acessibilidade nos seus estabelecimentos acaba deixando de atender um nicho importante de mercado, que também está apto a gastar um ou dois reais numa balinha de hortelã e, por consequência, perdem a preferência das pessoas que nos acompanham. O Varanda passou na avaliação. 👍


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